sexta-feira, 19 de março de 2010

Ich bin Ausländerin

A cena se deu numa Wohnung party, ou seja, numa festa de apê. Era aniversário de uma brasileira estabelecida em Berlin. Funciona assim: o convidado leva o que vai beber e o anfitrião faz quitutes, beliscos e comidinhas. Rola música e muito cigarro. O apartamento ficou cheio e eu me revoltei em dado momento ao ver um monte de gente sentada no chão enquanto a música animada me chacoalhava o esqueleto. Mas também porque não tinha mais espaço pra todo mundo e quem senta ocupa espaço de duas ou mais pessoas. Animei a galera que se levantou e começou a dançar (isso faz de mim uma legítima brasileira?) Enfim, me diverti muito e tive um diálogo especial, que dá título ao texto: "Eu sou estrangeira". Já inicialmente eu havia decidido comigo mesma que só falaria alemão naquela noite. Como aqui quase todo cidadão alemão fala inglês, às vezes fico triste por não falar alemão com mais frequência. Eu já estava no segundo copo de vinho, quando um rapaz bonito e polido se aproximou. Me apresentei, falei da minha relação com a dona da festa, quando ele me perguntou se eu poderia falar em inglês ou espanhol. Eu disse que podia me comunicar nas duas línguas, mas que preferia continuar falando em alemão. Foi quando ele me disse que não falava em alemão com estrangeiros. Fiquei surpreendida. Pela primeira vez fui explicitamente tratada como Ausländer, ou seja, estrangeira. Palavra que pode ter um sentido prejorativo. Num misto de indignação e grosseria, eu disse em alemão que por isso não conversaria mais com ele aquela noite. Não preciso falar que foi uma sensação horrível, né? Então até hoje eu fico tentando achar uma explicação para a tal situação. Eu vi como grosseira, a princípio. Mas pode ser também que o cara quisesse aproveitar pra falar em inglês e espanhol (se ao menos fosse em português seria mais compreensível da minha parte). Ou que meu alemão era suficientemente péssimo pra provocar aquela reação no rapaz. Penso que seja complicado para um alemão ver sua língua sendo esculhambada por alguém de fora. É mais fácil esculhambar a língua mãe alheia, no caso a inglesa ou a espanhola. Não sei. Não sei mesmo. Mas aquela foi a primeira vez que alguém jogou na minha cara que eu era uma estrangeira. Logo eu, que me sinto tão cidadã do mundo... 

Um comentário:

  1. Isabela... Lendo apenas o início da sua história me deu mesmo a impressão de que o cara queria aproveitar a "estrangeira" para treinar suas habilidades em outra língua. Foi mesmo o que pensei antes de ler que isso passou pela sua cabeça. O lado ruim de se ler uma história (o que pode ser absolutamente maravilhoso em tantos outros casos) é que a gente perde a tal da entonação. A gente não pesca de que jeito o cara estava falando. Se eu conheço um americano aqui na minha terra, vou querer muito falar em inglês com ele. Mas também ajudaria, caso ele quisesse, a falar o português, como já fiz. Quando a gente é cidadão do mundo, a gente acaba por ser estrangeiro sempre. Mas cabe a nós criar a nossa volta o acolhimento de um lar, onde quer que os nossos pés nos levem. Gosto de uma frase de desenho não sei se dita por Timão ou Pumba, que diz que lar é onde o bumbum descansa. Há os que são nativos e não descansam o bumbum nem dentro de seu próprio lar...

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