terça-feira, 30 de março de 2010

Meu tempo é assim

Três dias por semana: 5 horas na biblioteca, com 15 minutos pro lanche.
Duas xícaras de café por dia acomphadas com um cigarro.
Ontem mal comi e não tomei banho: os prazos se apertam.
Não tenho tempo pra comprar o líquido que tira o esmalte e minhas unhas têm manchas cor de rosa.
A noite cai trazendo a lua cheia.
Berlin é linda com sol.
As pessoas são lindas com sol.
Caminho pela cidade como quem vê com a sola dos pés.
Minhas amigas casadas parecem longe. Meu mundo parece querer ficar sozinho. Lembro de Rilke e suas solidões.
Divago pra esquecer das palavras, depois da escrita como compromisso. Tenho sonhado com construção de frases e articulação do material coletado.
Assito Tv e ouço rádio, aber mein Deutsch ist kaputt...: )
Eu faço ciência ao observar o mundo.
Os fatos históricos são apenas fatos históricos.
Auguste Comte não acreditava na medicina do século XIX. Seu positivismo achou que o seu organismo se recuperaria por si só. Morreu agonizando e Nísia Floresta tentava convencê-lo ao tratamento. Ela acreditava na homeopatia.
Tomo água da torneira, em temperatura ambiente.
Aqui a temperatura oscila entre os 7 e 21 graus positivos.
Mandei a papelada hoje e agora estou relaxada. Penso em nadar.

Angela Merkel está em Stambul indo para Ankara. Os turcos têm poder na Alemanha. Os turcos, os árabes, os libaneses de Berlin, são os baianos, paraibanos e cearences de São Paulo.

sábado, 27 de março de 2010

Post como exercício: pensando nas influências políticas de Mathilde Anneke

Karl Marx foi obrigado a deixar a Alemanha pela primeira vez em 1843. As mudanças que se esperava com a ascenssão de Frederick William IV como rei da Prússia em 1840, foram frustradas. Tal rei, acreditava no direito divino de governar e rejeitou as sugestões de constituição prometidas por seu pai. Dizia que um pedaço de papel não poderia estar entre ele e seus súditos. Na época Marx estudava na Universidade de Berlin e por criticar o governo, foi perseguido pela censura e obrigadado a deixar a Prússia. Em Paris conheceu Heinrich Heine, poeta de língua afiada que ousou criticar Goethe. Heine era de família judia e viveu boa parte no exílio; recusou a cidadania francesa por amor a Alemanha. Mas não teve identidade consistente com nenhuma tendencia política; denunciou autores que se vendiam para o mercado e para o sistema existente. Era evidente que nos anos que antecederam à Revolução de 1848, a cultura tornou-se politizada: a produção em prosa e verso passou a ter forte conteúdos político e social, denunciando a pobreza no campo e a exploração dos trabalhadores.
Eis que no início de 1848, Karl Marx retorna à Alemanha se estabelecendo em Colônia, onde funda um jornal com Engels. Vinda de Münster e recém-casada com Fritz Anneke, Mathilde também se estabelece na cidade. A escritora e jornalista já era conhecida, também por ter publicado um artigo em defesa de Louise Astor, banida de Berlin em 1846 por manter um comportamento considerado inadequado a uma mulher. Então os destinos de Mathilde Anneke e Karl Marx se cruzaram. Liberais, republicanos, libertários, comunistas em gestação, enfim, as vozes que eram contrárias ao sistema político que ainda mantinha características absolutistas, se encontravam em Colônia. Tanto que foram lá as primeiras manifestações contra o governo prussuano iniciadas em 1848. Jornais foram fechados, pessoas foram presas, entre elas o marido de Mathilde. E ela tomou a frente da publicação e continuou na defesa dos seus ideais. Estava grávida de 7 meses nessa ocasião. O jornal foi censurado e fechado. Meses depois, em setembro, ela publicou apenas dois números do Frauen-Zeitung, antes de ser silenciada pelas autoridades. Defendeu o marido nas páginas dos jornais. Em dezembro Frtiz é libertado. Marx e Engels publicavam o Neue Rheinische Zeitung, algo como Novo Jornal do Reno e por conta da censura foram obrigados a fechar o jornal e deixar a Alemanha em maio de 1849. Enquanto Marx e Engels seguiram para Paris e depois para Londres, o casal Anneke seguiu em exílio para a Suiça e depois para os EUA.

Deixo uma foto minha no colo de Marx e Lebrão entre as pernas de Engels em Berlin:

     

sexta-feira, 26 de março de 2010

A linda Chimamanda Adichie

Depois que vi esse vídeo, senti que elegi essa mulher minha porta voz. Chimamanda Adichie é escritora e fala do perigo da história única. Fala de um jeito especial ,com um viés biográfico especial.

Aconteceu mais de uma vez. Quando sou apresentada a alguém, ou quando simplesmente me apresento e segue-se toda aquele primeiro diálogo, a pessoa diz que é da África. E eu então fico instigada e pergunto, mas de que cidade, de que país da África? Então penso no perigo da história única... 

quarta-feira, 24 de março de 2010

Mudanças de guerra

As duas mulheres enfocadas no meu trabalho de pesquisa viveram a realidade da guerra civil. A família de Nísia Floresta mudou-se para várias cidades do nordeste do Brasil antes de se estabelecer em Porto Alegre em 1933. O pai era português e eram tempos de conflitos em Pernambuco (1817) e da Confederação do Equador de 1824, quando o alvo eram os portugueses na onda de movimentos independentes na América Latina. Advogado, foi assassinato numa emboscada em Olinda, quando Nísia tinha 18 anos. Dois anos depois de ter se estabelecido no sul do país, a Revolução Farropilha obrigada novamente à mudança. Desta vez para o Rio de Janeiro, já viúva, era chefe de uma família composta por mulheres e crianças. Uma vida guiada pelas guerras no hemisfério sul. Do outro lado do mundo, outra vida guiada pela realidade da guerra. A alemã Mathilde Anneke, após participar da Revolução de 1848 ao lado do marido, foi exilada política nos EUA. Lá escreve ativamente nos jornais e faz palestras públicas, atividade que no século XIX praticamente acabou. Com a guerra civil nos EUA (1861-1865), ela novamente cruza o Atlântico (eram mais de 2 meses de viagem de navio...) e se estabelece na Suiça por 5 anos, até quando a guerra acabou, voltando para a América. Mulheres mães, viram alguns filhos mortos e pareciam ter um sentido de família diferente do que era normatizado: casaram cedo por arranjo, mas contestaram essa condição e abandonaram o primeiro matrimônio, atitude escandalosa para uma mulher de elite em qualquer lugar do mundo no século XIX. Escolheram seus amores e com eles criaram uma família.
Mulheres que admiro pela biografia, que persigo pelos livros e contextualizo as vidas... sobre as quais devo escrever ali na outra janela. Os prazos apertam...

segunda-feira, 22 de março de 2010

Kaiser-Wilhelm-Gedächtniskirche

Mais do que uma igreja protestante, o prédio funciona como memorial. A igreja foi construída no final do século XIX levando o nome do pai do rei, William, como uma homenagem. O prédio foi bombardeado durante a Segunda Guerra Mundial e decidiu-se por não restaurá-lo e assim servir como lembrança daqueles anos. Uma nova torre, mais moderna, foi construída ao lado e o efeito dos mosaicos é surpreendente. A igreja fica no centro de Berlin ocidental, próximo ao mais importante centro comercial, onde fica o famoso KaDeWe, a loja de departamentos mais antiga da cidade, fundada em 1907 e que é um luxo só.
Gosto muito desse compromisso assumido pela cidade (e pelo país de um modo geral) com suas mazelas históricas. Encara as feridas de frente, numa metáfora de pouco bom gosto. Há quem diga que é exagero, que já existem monumentos suficientes. Lembro da polêmica sobre a construção do memorial judaico, próximo a Potsdamplatz e que sofreu críticas por estar disposto num terreno enorme e num lugar de valorização imobiliária. Também por isso muita gente diz que visitar Berlin é triste. Não posso discordar: aqui foi capital de um país nazista, regime cruel e desumano. Seu território foi dividido pelos vencedores de uma guerra insana, como num jogo de tabuleiro. Mais tarde seus cidadãos conviveram com um muro que separou a cidade, mas também familiares, amigos e amores. Jovens que tentaram atravessar essa barreira eram alvejados sem dó. Por tudo isso Berlin recebe um ar de tristeza. E a torre da igreja-memorial Rei William é mais um monumento da cidade que faz lembrar. Encarar suas dores históricas não é fácil e Berlin faz isso de forma aberta e quase espontânea, basta caminhar pela cidade.
  

domingo, 21 de março de 2010

Baixada Berlinense

Os ensaios acontecem uma vez por mês. A regente do grupo é a Deborah Saraiva, que com seu apito instrui e estimula o grupo. Fui convidada para participar de um ensaio e foi muito divertido. Em dado momento, quando tocávamos um funk, os olhares e os sorrisos de satisfação do grupo que se olha a todo momento no ensaio, me provocaram uma onda de emoção que meus pelos todos do corpo se arrepiaram. Tão bom quando a música entra na gente desse jeito e o corpo responde, fisicamente. Alma e corpo em sintonia. A Baixada Berlinense é formada por mulheres, brasileiras e alemãs, que se apresentam esporadicamente. Eu toquei agogô e repique nesse ensaio. E encontrei a MC Xuparina, que chegou em Berlin direto de Santa Teresa. Eu conheci a Marcela Maria vendendo cartões entre a Lapa e Santa e foi muito legal encontrá-la além do Atlântico. Deixo algumas fotos do meu sábado musical.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Ich bin Ausländerin

A cena se deu numa Wohnung party, ou seja, numa festa de apê. Era aniversário de uma brasileira estabelecida em Berlin. Funciona assim: o convidado leva o que vai beber e o anfitrião faz quitutes, beliscos e comidinhas. Rola música e muito cigarro. O apartamento ficou cheio e eu me revoltei em dado momento ao ver um monte de gente sentada no chão enquanto a música animada me chacoalhava o esqueleto. Mas também porque não tinha mais espaço pra todo mundo e quem senta ocupa espaço de duas ou mais pessoas. Animei a galera que se levantou e começou a dançar (isso faz de mim uma legítima brasileira?) Enfim, me diverti muito e tive um diálogo especial, que dá título ao texto: "Eu sou estrangeira". Já inicialmente eu havia decidido comigo mesma que só falaria alemão naquela noite. Como aqui quase todo cidadão alemão fala inglês, às vezes fico triste por não falar alemão com mais frequência. Eu já estava no segundo copo de vinho, quando um rapaz bonito e polido se aproximou. Me apresentei, falei da minha relação com a dona da festa, quando ele me perguntou se eu poderia falar em inglês ou espanhol. Eu disse que podia me comunicar nas duas línguas, mas que preferia continuar falando em alemão. Foi quando ele me disse que não falava em alemão com estrangeiros. Fiquei surpreendida. Pela primeira vez fui explicitamente tratada como Ausländer, ou seja, estrangeira. Palavra que pode ter um sentido prejorativo. Num misto de indignação e grosseria, eu disse em alemão que por isso não conversaria mais com ele aquela noite. Não preciso falar que foi uma sensação horrível, né? Então até hoje eu fico tentando achar uma explicação para a tal situação. Eu vi como grosseira, a princípio. Mas pode ser também que o cara quisesse aproveitar pra falar em inglês e espanhol (se ao menos fosse em português seria mais compreensível da minha parte). Ou que meu alemão era suficientemente péssimo pra provocar aquela reação no rapaz. Penso que seja complicado para um alemão ver sua língua sendo esculhambada por alguém de fora. É mais fácil esculhambar a língua mãe alheia, no caso a inglesa ou a espanhola. Não sei. Não sei mesmo. Mas aquela foi a primeira vez que alguém jogou na minha cara que eu era uma estrangeira. Logo eu, que me sinto tão cidadã do mundo... 

quinta-feira, 18 de março de 2010

Percepções: Munique e Viena

Eu sempre ouvia que o sul da Alemanha é mais católico, assim como a Áustria. E isso foi logo perceptível. Uma das principais estações de metrô de Munique se chama Marieplatz e em Viena a rua que me levava ao albergue da juventude em que me hospedei era a Mariehilferstrasse, ou rua Maria do Socorro, em tradução literal. Não conheço nenhuma rua com esse nome em Berlin, sequer estação de metrô. Mas temos a rua Karl Marx, uma estação de metrô e ainda uma alameda que leva o nome do filósofo. Temos a praça Rosa Luxemburgo e a Friedrich Engelsstrasse também. Entrei em mais de 7 igrejas em Viena, todas católicas e riquíssimas. Eu fazia assim: saia andando sem rumo, apreciando a arquitetura e sentindo o clima. Foi assim que entrei nas igrejas, sem um plano previamente traçado. E foi assim também que entrei em clube de rapel, palestra de literatura, ateliers de pintura e vernissagens. A grande surpresa pra mim foi a Biblioteca Nacional da Áustria (foto do seu interior abaixo). No café da ópera me dei ao luxo de comer um pedaço da famosa Sachertorte acompanhada de um café Mozart, que leva conhaque (foto). Fazia frio e o vento era forte. Então entrar nos lugares, abrir portas desconhecidas funcionava também como estratégia de fuga do clima rigoroso.
Em Munique vi rapazes indo pra balada com aquelas vestes típicas em que se vê apenas em tempos de oktober fest em Blumenau. Claro que não tão esteriotipados, mas vi uns com aquelas calças curtas feitas de um tecido que parece feltro, levando uma garrafa de cerveja. Outros portavam o chapéu típico da Baviera. No domingo teve jogo de futebol e alguns uniformizados entraram na estação aos berros, fazendo arruaça e cantando algo para irritar os policiais, pois ouvia a palavra politizei. Tanto em Munique como em Viena vi mulheres mais velhas portando lenços na cabeça e posso garantir que não eram muçulmanas e sim católicas mais antigas.  Fica na região de Munique, que é a capital do estado da Baviera, a cidade de Regensburg, alvo de um escândalo recente envolvendo o irmão do papa Bento XVI, Georg Ratzinger. Ali fica o coral mais antigo e famoso do mundo, os canarinhos da catedral de Regensburg, que segundo denúncias, muitos de seus membros infantis sofreram abusos. O assunto é pauta de discussão em todo país, um escândalo, enfim.
Em Viena fui "recepcionada" com uma passeata que, segundo os jornais do dia seguinte, reuniu mais de 10 mil estudantes (fotos). Tinha trio elétrico com música eletrônica, tinha grupo de percussão, alguns malucos divertidos vestidos de palhaço. Era uma manifestação estudantil contra o acordo de Bolonha, uma tentativa da União Européia de padronizar o ensino superior e que tem sido acusado de alinhar a educação ao mercado, ao sistema e tal. Recebi mini jornais, mas não pude entender o assunto à fundo. Desci a praça Europa, pela rua Maria do Socorro acompanhando a passeata, mas meus passos rápidos me levaram a disperssão. Não preciso dizer que a cidade estava repleta de policiais e até helicóptero sobrevoou a rua. Naquela noite ainda caminhei no bairro judeu com ruas estreitas e charmosas. Jantei num restaurante italiano, mas tomeu cerveja austríaca. Na caminhada do dia seguinte, notei e fotografei mais de uma vitrine com imagens de fetos em desenvolvimento e panfletos oferecendo ajuda à mulheres com gravidez indesejada. Panfletos em 3 línguas, como os da foto,  ficavam também penduados para o lado de fora da "loja". O aborto é legalizado na Áustria desde 1975 e certamente por ser um país bastante católico, há uma espécie de contra-ofensiva da Igreja na tentativa de impedir que as mulheres abortem. O que eu achei mais interessante foi isso aparecer em ruas comerciais, explicitamente, como uma loja ou coisa assim. Em uma das vitrines havia a imagem de uma santa. Acabei escrevendo mais sobre Viena. E meu tempo expirou por hoje.


terça-feira, 16 de março de 2010

O Congresso de Viena

Minha pesquisa é sobre o século XIX, mais especificamente a primeira metade. E nesse período, o Congresso de Viena foi um acontecimento político marcante. Com a queda de Napoleão Bonaparte, as potências européias, sob o comando do Império austríaco, se reuniram em Viena entre 1814 e 1815. A reunião é conhecida como um marco da restauração das monarquias, mas não quero falar em historiografia aqui. Quero escrever sobre Viena...
 Pois bem, a queda de Napoleão motivou o encontro em Viena. Então esse era o meu maior interesse quando estive na cidade. A capital da Áustria foi bastante polpada pelas guerras todas. Penso isso se a comparo com Berlin, onde os prédios com mais de 150 anos são bem raros. Então, cidades como Praga ou Viena se agigantam. O Congresso de Viena aconteceu no palácio Hofburg, cede da monarquia austríaca na época. Os Habsburgo governaram a Áustria por cerca de 600 anos, mas mantiveram ligações consaguineas com vários países e dinastias. Era a velha tática de casamentos arranjados. Foi assim que a mulher de "sangue azul", Leopoldina Habsburgo casou-se com o nosso futuro D. Pedro I, por procuração, em 1817. Eu passei pouco mais de 24 horas na cidade e bastava caminhar pela cidade velha, um museu a céu aberto. Porém a visita ao castelo onde ocorreu o Congresso estava mesmo nos meus planos. Na primeira parte do museu estão em exposição a prataria, adereços e porcelanas da corte e seus convidados. E está lá o rico acervo de talheres, pratos e baixelas produzidos exclusivamente para os nobres convidados de Metternich, nobre que presidiu a reunião iniciada em 1814. A riqueza e suntuosidade enche os olhos antes de revoltar. Na região da Boêmia, hoje parte da República Checa, eram produzidas as porcelanas. E que produção: rica em ornamentos em ouro e cores fortes. Os pratos mais elaborados levavam 5 anos para serem produzidos e segundo informações do museu, conservam até hoje os segredos na sua elaboração. As peças em ouro são um desbunde incrível.
Na segunda parte do museu, onde estão os aposentos, há uma exposição sobre a famosa imperatriz Sisi, imortalizada pelo cinema também por Romy Schneider, que fez seu papel nos anos 1950. Sisi era o apelido carinhoso de Elisabeth, duquesa da Baviera, que se casou com o rei austríaco Francisco José I. Impressionado com a beleza da prima, desposou-a em 1864, quando ela tinha 16 anos de idade. A exposição é rica e mostra bastante seu acervo pessoal. Até seu luxuoso figurino negro usado depois do suicídio de seu filho, em 1889. Mas também os acessórios de ginástica, que ela praticava diariamente. Tida como avessa ao protocolo exigido pela condição de imperatriz, gostava muito de viajar. E foi em uma dessas viagens que encontrou a morte. Na Itália, em 1898, um ativista anarquista cravou-lhe uma faca no peito. Certamente esse desfecho trágico tornou sua trajetória lendária.
Eu já fiz alguma referência a isso aqui no blog. E volto a afirmar: o excesso, a riqueza, a suntuosidade que as monarquias, por tradição, ostentavam como sendo naturais e por tão longo tempo, me parecem incabíveis no século XIX. E a reunião em Viena teve esse significado, como um arranjo entre as potências e as dinastias monárquicas. Apesar de Napoleão ter-se auto coroado imperador em 1800, ele não não tinha sangue azul e, de algum modo, disseminou os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade pro resto do continente. Só um exemplo. Antes de Napoleão, em algumas regiões da Prússia, os camponeses não tinham liberdade sequer de se casarem com quem bem entendessem, quanto mais de se desligarem da terra. Ranços do feudalismo que só desapareceram porque seus governantes se viram obrigados a agirem assim, sob o perigo da dominação francesa.
Depois do congresso os movimentos de 1848 demarcaram ainda mais as posições. O Manifesto Comunista, as divergências entre Karl Marx e Bakunin são alguns exemplos de que o mundo não seria mais o mesmo. O descompasso foi violento e o jovem anarquista italiano, Luigi Lucheni, só pensava em uma coisa: ferir um integrante da realeza que representava retrocesso e desigualdade. Não importando qual. E Sisi estava no seu caminho, morrendo a mulher e nascendo o mito. A faca usada no seu assassinato está lá, em exposição, junto de uma das várias presilhas cravejadas de diamantes que ela usava em ocasiões especiais. 
Amo estudar o século XIX...!

segunda-feira, 15 de março de 2010

Central de caronas

A coisa funciona assim: a pessoa entra no site, preenche os campos desejados e o sistema localiza as pessoas que oferecem lugar no carro. Carona paga, digamos assim. Viajar de trem na Alemanha (e penso que pela Europa de modo geral) é caro. Existem promoções relâmpagos, mas isso depende de sorte ou coisa assim. Tem o ticket de final de semana que é bem barato, mas vale para 5 pessoas. Serve para estimular as famílias a viajarem nos trechos curtos. Foi no site do Mitfahrzentraler que eu e a Laurance encontramos o Xi Chang. Ele é chinês, estudante de engenharia ferroviária em Berlin e que tinha um ticket de final de semana para Munique, por 10 euros, valor que normalemente gira em torno de 110 euros. Consideramos um achado, apesar das 9 horas de viagem e das trocas de trem que fizemos. Mas tivemos alguns fatores negativos: tempestades de neve e acidentes fizeram nossa viagem durar 11 horas, entre atrasos, trechos percorridos com ônibus e caos. Eu fiz sanduíches, levei bombons e frutas. Considerando o exotismo que é viajar de trem pra mim, continuo achando que valeu a pena. Falamos da China, de religião sob o comunismo e desenvolvimento. Dividimos o alimento e dormimos. Sempre que tenho oportunidade de conversar com uma pessoa da China, falo com cautela, pois faço boicote aos produtos de lá e não posso falar assim abertamente com um chinês. A China pra mim é sinônimo de mistério. E a minha ânsia em saber, perguntar e questionar sobre o país, talvez coloque a pessoa tímida. Já tive uma situação assim na escola de línguas: assustei o cara que me cortou abruptamente. Penso que todo chinês que está fora da China, está, de alguma forma, envolvido com o sistema, bancado por ele ou algo parecido, dada à falta de liberdade. Há uns meses atrás encontraram chineses traficados para o norte do Brasil.  

Enfim, não é sobre a China que desejo escrever. É sobre o sistema de caronas que existe aqui. Lembro de uma tentativa de implantar o mesmo no Brasil, mas que não vingou. Conheço gente que viaja de Berlin pra Europa toda pelo Mitfahren. Tenho planos de visitar Dresden no próximo final de semana. Mas por enquanto tem um documento do word aberto em outra janela me esperando...

domingo, 14 de março de 2010

O castelo de Neuschwanstein

O castelo fica no estado da Baviera, no sul da Alemanha, próximo à fronteira com a Áustria. E é famoso por ter inspirado Walt Disney em Cinderela. O número de visitantes é imenso e notei que nas placas indicativas, ao lado do alemão, a informação é dada também em japonês. É notável mesmo a quantidade de turistas de olhos puxadinhos. Fiquei imaginando o "inferno" que é o lugar no verão, já que mesmo com neve o tumulto foi grande. Fui sozinha de trem de Munique até Füssen. Cerca de 2 horas apreciando paisagens frias, com montanhas e neve. Um ônibus leva os turistas à região dos castelos. Queria ter passeado por Füssen, uma cidadezinha super charmosa, mas não tive tempo. Do ônibus avistei muralhas antigas, que um dia protegeram a cidade, fundada durante o Império Romano. Na sua história recente, cediou um subcampo de concentração de Dachau.
A caminhada até o castelo foi intensa: montanha e frio. A riqueza do interior de Neuschwanstein é surpreendente. Ludwig II era o rei da Baviera quando assistiu a ópera de Richard Wagner, aliás, a quem nutriu especial admiração. Há uma sala do castelo com motivos inspirados em Tristão e Isolda. A proposta inicial era uma construção inspirada na Idade Média, revigorada pelo romantismo alemão do século XIX. A construção foi iniciada em fins dos anos 1860 e o rei pra lá mudou-se em 1884. Era um rei recluso e que sofreu por não encontrar equilíbrio em tempos de tantas guerras. Tinha problemas mentais e expressou toda a sua fantasia na construção desse castelo. Morreu em circunstâncias misteriosas em 1886. Meu sentimento é sempre de admiração quando visito esses lugares, a personificação do glamour do Antigo Regime. Foi assim em Versalhes e em Viena. Depois, pelo excesso, vem o terror. Fica mais fácil entender a Revolução Francesa, por exemplo.


quinta-feira, 4 de março de 2010

Underground é pouco pra Tacheles

Marquei de ver uma amiga, a Cristina, romena que morou no Brasil. Ela escolheu o Studio 54, na Orienerburstr. por ser perto do novo trabalho dela. Nos encontramos na frente pro chá das 5. Tomei uma cerveja que veio em forma de chopp. E ela um chá de limão quente. Hoje de tarde nevou. Depois subimos as escadas da Tacheles (ou será que descemos?) O trabalho de colagem desse cara provocou em mim sentimentos de inveja e saudade, já que não pico papel há tanto tempo. Josefine Backer vive. Zapatismo em Berlin. Descobri o maravilhoso Alex Rodin, que volta em 2 semanas pra Berlin. Quero muito conhecê-lo. As imagens de lá mobilizam meus dedos. Ficam elas... 

terça-feira, 2 de março de 2010

O campo de Sachsenhausen

Desde que cheguei em Berlin ensaio pra visitar o campo de concentração de Sachsenhausen, no distrito de Oranienburg, ao norte da cidade. Passeio importante mas um tanto desagradável. Resolvi acompanhar um amigo brasileiro de passagem pela cidade que ficou hospedado na minha casa. Já no trem, pensamos que foi por aquele mesmo caminho que há algumas décadas atrás os prisioneiros eram transportados até lá. O lugar é grande, um terreno em forma de triângulo, o mesmo formato do símbolo de identidade posicionado no uniforme que os prisioneiros usavam, mudando apenas a cor. Como um sistema de identificação: vermelho para os inimigos políticos, rosa era usado pelos homossexuais, testemunhas de Jeová usavam roxo, o triângulo de cor castanha era para os ciganos, os prisioneiros estrangeiros usavam o azul, as mulheres de má fama o preto, os judeus usavam o triângulo amarelo. Muitos judeus portavam dois triângulos coloridos, formando a estrela de David. Em alguns momentos da visita o que vimos foi tão absurdo, tão desumano, que ficava difícil acreditar que aquela foi uma história real. Mas tudo ali era pra ser lembrado, jamais esquecido. Não se paga taxa alguma para a visitação. Havia muitos grupos de jovens, tanto estrangeiros como alemães com seus professores. A temperatura abaixou bastante de ontem pra hoje, e fomos surpreendidos por uma chuva que eu nunca tinha visto: pequenas bolinhas de gelo, que não eram de neve em floquinhos, mas pedacinhos pequeninos de granizo. 
Logo na entrada do complexo, a frase típica dos campos nazistas: "Arbeit macht Frei", algo como: "O trabalho liberta." Inicialmente era um campo de trabalhos forçados e foi um dos primeiros a serem fundados, em 1936. Mais tarde, com a chamada solução final, o lugar foi palco de barbaridades: as trincheiras e valas estão lá, como veias abertas do horror. Por lá passaram cerca de 200 mil pessoas, muitas foram figuras importantes, como juristas, homens de negócio, políticos estrangeiros e alemães, principalmente de esquerda (comunistas ou da social democracia), considerados inimigos políticos pelo regime nazista. Esses ficavam em celas individuais, diferente dos trabalhadores, que ficavam em alojamentos coletivos. Em um dos cômodos da prisão, ficava um prisioneiro especial de Hitler: um padre comunista. Desculpe o descuidado, mas não anotei nada ali, e portanto não sei o nome dessa figura. Escritores, políticos eleitos e judeus de destaque ficavam ali, numa espécie de solitária. A sala de banho (espécie de bacia gigante com um chafariz no meio) e os toilettes coletivos estão lá e martelam a cabeça do visitante, como uma bigorna histórica.... 
Um grupo de trabalhadores "privilegiados", já que podiam ler jornal, jogar tênis de mesa e cartas, receber cartas e caixas de comida da família, eram responsáveis pela produção de documentos oficiais do banco inglês. Eu deduzi que eram espécies de notas promissórias oficiais: papéis delicados e importantes, enfim. Entre os objetos expostos, vimos talheres e uniformes, instrumenstos de tortura e restos de fornos crematórios, além de objetos pessoais que trouxeram todo o horror mas também a (des)humanidade praticada por e contra seres humanos. Alguns vídeos mostraram o campo e a relação com a cidade. As famílias dos oficiais da SS, a polícia nazista, foram morar ao redor do campo e tinham uma vida em comum com os cidadãos: as crianças frequentavam a escola, a dona-de-casa comprava coelhos e galinhas abatidos pela vizinha, moças se apaixonaram e se casaram com homens da SS. Foi ali em Sachsenhausen a central de todos os campos de concentração nazistas. Muitos oficiais foram treinados ali. Como um lugar de disseminação do terror. Em 1945, com o fim da guera, os soviéticos transformaram o campo em prisão por cerca de 5 anos, e mais de 12 mil pessoas morreram ali nesse período.
Enfim, o lugar lembra morte e sofrimento, opressão e tortura. E deve servir como monumento de reflexão, sempre.

segunda-feira, 1 de março de 2010

O sol que traz o azul

Tenho na memória a voz do meu pai cantando: "Oh sol, tu que és o rei dos astros...!" E fico mesma nostalgica ao pensar que não vou mais ouvir sua cantada. Ele sentava sob o sol e curtia cada raio no rosto, deliciosamente. E depois de dias de muito frio e neve, Berlin recebe com mais frequência um banho de sol merecido e que deixa a cidade linda. Quando eu cheguei ouvi de mais de um brasuca o lamento pela falta de sol. O céu fica na maior parte do ano cinza por aqui. E quando o sol brilha e faz o céu azul, até o semblante das pessoas parece mudar. As ruas ficam mais agitadas e as caminhadas mais tranquilas sem o gelo no chão.Enfim, escrevo esse post por constatar a importância que um céu azul, mesmo ainda sob um dia frio, tem. Não só pra mim, mas certamente pros outros seres humanos que habitam essa terra aqui. Então cantarolo pelas ruas a melodia que meu pai me ensinou. Entre homenagem e saudade, lembro dele vendo a neve derretir na cidade. Como é importante, fundamental, a força do astro rei pra vida na Terra.
Oh sol, tu que és o rei dos astros...